segunda-feira, 19 de maio de 2014

O imitador de vozes - Thomas Bernhard

"Oi, eu sou Thomas Bernhard e vou te provar que a vida é uma merda"


Thomas Bernhard foi outro autor que descobri através do programa Provocações (já escrevi um post falando sobre como, antes dos blogs/vlogs literários, essa era uma das minhas principais fontes para conhecer novos autores – se se interessar, clique aqui).

Se não me engano o apresentador, Antonio Abujamra, falava sobre pessimismo/realismo e então comentou sobre esse autor. Claro que isso atiçou minha curiosidade!

Confesso, porém, que, após ganhar o livro “O imitador de vozes” a leitura demorou um pouco pra deslanchar porque, pelo menos comigo, há períodos em que estou querendo me apegar a personagens de romances e em outros prefiro a brevidade de contos.


A capa já é um dos seus contos. Bom pra se ter uma ideia do que virá.


No caso dessa obra, ou melhor, dessa coletânea, temos em apenas 158 páginas mais de 100 contos! Imagine o quão curtos são! Ao mesmo tempo, imagine a contundência deles! Digo isso porque, por menores que sejam, muitos dos contos finalizam como um soco no estômago ou como a suspensão de um possível clímax. Há incontáveis mortes por motivos bestas, suicídios e diversas atitudes tomadas com a sinceridade e ao mesmo tempo cinismo com que “as coisas como são” acontecem.

Após ler alguns contos fui arrebatada pelo estilo de Bernhard, mas confesso que não sei se daria conta de ler um romance dele.

Recomendo esse livro a pessoas que gostam de uma abordagem niilista da realidade.

Creio que leitores de Kafka gostarão dele, mas não recomendo uma maratona seguidas dos dois autores, porque sempre precisamos deixar uma esperançazinha besta pra termos vontade de levantar todas os dias da cama.

Deixo aqui outro aperitivo:


Decisão
Segundo cuidadosas estimativas, duas mil e quinhentas pessoas perderam a vida no último terremoto que assolou Bucareste, mas cálculos exatos revelaram que cerca de quatro mil pessoas morreram sob os escombros. No mínimo quinhentas pessoas a menos teriam morrido se a cidade tivesse agido contrariamente às ordens expressas do funcionário da administração municipal encarregado do assunto – que determinou que os escombros de um hotel completamente destruído fossem aplanados em vez de removidos – e houvesse, portanto, removido os escombros.
Uma semana após o terremoto, pessoas ainda ouviam os gritos de centenas de soterrados, provenientes daqueles mesmo escombros. O funcionário da administração municipal, no entanto, mandou isolar a área em torno do hotel, até que lhe informassem que nada mais se movia ali e que mais nenhum som provinha dos destroços. Somente duas semanas e meia depois do terremoto foi permitido aos habitantes de Bucareste examinar a montanha de escombros, que na terceira semana foi aplanada por completo. O funcionário teria deixado de salvar, por uma questão de custos, os cerca de quinhentos hóspedes soterrados do hotel destruído. O resgate teria custado mil vezes mais que o aplanamento, e isso sem levar em conta que teriam sido retirados dali provavelmente centenas de feridos graves, os quais o Estado precisaria manter por toda a vida. Naturalmente, consta que o funcionário teria se certificado também da concordância do regime romeno. Sua promoção a posto mais alto do governo, diz-se, seria agora iminente.


Caso você decida ler o livro ou já tenha lido e sobrevivido sem tentar dar um tiro na cabeça, venha contar sua experiência! :D

Um comentário:

  1. Oi, Thays!
    Eu pensei: nã, nã, não vou ler o aperitivo... Acabei lendo e até hoje, conferi o post assim que recebi o feed pelo e-mail, fico com um dorzinha no estômago porque foi um puta soco bem dado o que recebi após ler "Decisão" e bom, tô com vontade de ler o livro!

    Beijos!

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